Anacleto, entre o apolíneo e o dionisíaco
Num post abaixo, citei o grande filósofo Anacleto de Avignon. Achei que ninguém se interessaria por ele, mas qual não foi minha surpresa quando alguns leitores - sim, eles existem - e amigos perguntaram sobre o injustiçado Anacleto. Pouco se sabe sobre sua vida, ao que parece transcorrida inteiramente em Avignon, entre 1573 e 1653. Católico fervoroso na juventude, funcionário público medíocre, Anacleto teve o estilo límpido elogiado até pelo anticlerical Voltaire. Seus aforismos lhe valeram a alcunha de La Rochefoucauld católico. A obra anacletiana se resume a apenas dois livros. O primeiro, “Reflexões de um jovem católico”, tem como aforismo mais importante o estóico “Privar-se dos prazeres é o maior dos prazeres”. Em seu outro livro, “Aforismos da maturidade”, os traços religiosos continuam presentes, mas sem o proselitismo exagerado do primeiro, como nota Otto Maria Carpeaux no pouco conhecido ensaio “Anacleto e a busca do equilíbrio entre o apolíneo e o dionisíaco”. Bakhtin é outro que dedicou algumas páginas a Anacleto, no seu livro “Problemas na poética de Dostoievski”. Para ele, o filósofo de Avignon antecipou o “Se Deus não existe, tudo é permitido”, que aparece em “Irmãos Karamazov”, ao escrever, no século 17, que “um mundo sem Deus é inconcebível, pois uma existência sem nenhum limite é insuportável até para o mais convicto dos incréus". Por que um gênio como Anacleto está quase esquecido? A resposta parece estar no ensaio de Carpeaux: quem tenta conciliar opostos aparentemente irreconciliáveis como o apolíneo e o dionisíaco não tem espaço num mundo que busca certezas cada vez mais absolutas como o atual
PS: Os livros de Anacleto nunca foram publicados no Brasil. Eu tenho dois exemplares editados em Portugal, no começo do século 20. Não vendo e não empresto de jeito nenhum
PS: Os livros de Anacleto nunca foram publicados no Brasil. Eu tenho dois exemplares editados em Portugal, no começo do século 20. Não vendo e não empresto de jeito nenhum
2 Comments:
Lembro-me de um Anacleto, o Estóico, dos bancos da Faculdade de Direito. Era um glosador, da escola avignonese. Será o mesmo?
By mauro, at 2:19 PM
Caro Mauro,
O nome de seu colega deve ser uma homenagem ao grande Anacleto de Avignon. E ela era estóico por opção ou porque nenhuma mulher se interessava pelo rapaz? É uma diferença crucial. Um grande especialista na obra de Anacleto me informa que o aforismo "Privar-se dos prazeres é o maior dos prazeres" é atribuído correntemente ao Ricardo Vázquez Montálban. Pobre Anacleto. O esquecimento de sua obra leva a acusações como essa, de que plagiou alguém que viveu depois dele. Mas acredito que a história ainda fará justiça a ele. Estou fazendo a minha parte ao divulgar sua obra
Um abraço,
Marcos
By Marcos Matamoros, at 4:29 PM
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