segunda-feira, abril 17, 2006

Minha experiência no mundo do teatro

Ao mencionar Gerald Thomas num post abaixo, eu me lembrei de que já fui namorado de atriz. Foi um período curioso. Eu rapidamente aprendi que gente de teatro não diz peça. O certo é espetáculo, mesmo que seja algo montado num espaço imundo, com atores de quinta categoria encenando um texto experimental de um dramaturgo desconhecido do interior do Piauí.
Eu gosto de teatro, antes que me entendam mal. Vi bons espetáculos com a minha ex-namorada. Mas a verdade é que assisti a coisas horrorosas. Talvez a pior de todas tenha sido Freud Anna, um espetáculo dançante sem diálogos baseado na relação entre o velho Sigmund e sua filha. Juro que não estou inventando. Tentei dormir, mas a música não deixou.
Foi nessa época que vi uma peça do Zé Celso (eu sei, eu sei, mas foi só uma vez) - Mistério Gozoso, de Oswald de Andrade. Poucas vezes assisti a algo tão amador. Os atores mal sabiam falar. E foi no Teatro Oficina, um dos piores espaços cênicos já construídos pelo ser humano. A encenação ocorre num corredor, e o público fica sentado nas laterais, como se estivesse numa arquibancada de campo de várzea. A grande virtude é que o espetáculo só tinha uma hora e meia, e não as cinco horas habituais das peças do diretor dionisíaco.
O pior eram as peças amadoras dos amigos dela, quase sempre experimentais. No começo, eu ficava encabulado, principalmente quando queriam saber o que eu tinha achado. Mas tudo ficou mais fácil quando o namorado de uma outra atriz me ensinou uma estratégia infalível: “Quando pedirem sua opinião, é fácil. Diga sempre: no gênero, nunca vi nada igual.” Grande frase: deixava o interlocutor feliz e não me obrigava a mentir. Afinal, que outra resposta melhor eu poderia dar para uma adaptação de Dom Casmurro com todo mundo nu? Para um Édipo Rei sem diálogos, usando a linguagem de quadrinhos? E para uma versão de Hamlet com o príncipe interpretado por um travesti? No gênero, nunca vi nada igual



5 Comments:

  • Caro senhor Matamoros,
    lamentavelmente nao tenho tido muito tempo de comentar tudo o que eu queria. POr vezes dou uma olhada por aqui, acho algo interessante, mas por incrível que pareca, o tempo me falta e muito nessas férias antes de semestre de verao.

    O senhor ficou sabendo do caso das escolas de base alemas? O que disseram sobre isso por aí? E a queda do senhor Berlusconi?
    Por aqui nao se fala muito de outra coisa. Serve até de contrapeso à chatice interminável dos preparativos para a copa.

    Quanto as observacoes que o senhor costuma fazer sobre arte, as acho sempre um pouco radicais. Às vezes penso compreendê-lo: por que nao podemos ir ao teatro como vamos ao cinema? Por que nao falamos de teatro como falamos de cinema?
    Acho isso complicado. E por certo nao é só o despreparo do público e o autismo dos artistas que faz com que a observacao e interpretacao artisticas se tenham tornado um amontoado de jargoes que nem estudantes de arte sao capazes de entender.

    A arte - como parece ser o caso de quase tudo em nossa sociedade - especializou-se. Nao estou querendo fazer aqui apologia alguma a experimentalismo sem sentido e a postura "a arte pela arte" que parece reinar nesses meios. Mas por vezes me espanto ao ler críticas com relacao a especificidade linguística que toma conta do mundo intelectual.

    Já há muito que "simples mortais" nao têm acesso ao "mundo seleto e complicado do discurso". Se formos prestar atencao nas mais recentes e "badaladas" correntes filosóficas veremos que sao justamente as que se ocupam com a lingua. Tenho para mim que o pensamento deve sim, tentar de todas as formas lidar com conceitos que se encaixem na realidade, sejam esses conceitos parte do nosso cotidiano ou amontoados de significados que só se tem acesso quando nos ocupamos verdadeiramente com um determinado assunto e método.

    Como podemos esperar que um filósofo - ou um intelectual que seja - fale uma lingua acessível demonstrando minúcias de pensamento se nao reconhecemos a especificidade desse mesmo discurso?
    Nao lhe parece que algo está no lugar errado?
    Geralmente nao converso com meu irmao sobre futebol. O esporte nao me interessa a ponto de me fazer querer entender como tudo funciona.
    Nao espero entretanto que comentaristas de futebol tomem cuidado com o meu "nao- interesse". Eles devem sim, analisar penaltis, faltas, ataques impedimentos, falhas técnicas etc. e isso com as ferramentas que possuem: conceitos e espressoes que melhor espelham o assunto de que estao tratando.
    Sei que o caso do intelectual que tem contato com a opiniao pública é de outra natureza, mas nao lhe parece um tanto de ingenuidade esperar que o discurso seja sempre simplificado a favor de uma maior inteligibilidade?
    Nao sei, tenho cá minhas dúvidas. Reconheco, as idéias que melhor espelham a realidade sao as que reluzem de tanta simplicidade. Entretanto essa claridade implica numa medida imensurável de consequencias que nem sempre se deixam reconhecer na simplicidade do pensamento original.


    Espero que o senhor me perdoe pela pedanteria...rs

    By Blogger Edo, at 6:35 PM  


  • Mon cher Matamoros, no gênero "no gênero nunca vi nada igual", recomendo o espetáculo "Sonhos de Einstein", no qual a Intrépida Trupe traduz elementos da física quântica em atos com técnicas circenses. A Bravo gostou...
    bisous

    By Anonymous Anônimo, at 6:48 PM  


  • Inesquecível é "O Futebol", com um Zeca Camargo padre e pelado.

    By Anonymous Anônimo, at 7:22 PM  


  • Por mulher, até peça do Gerald Thomas pode ser justificada...

    By Anonymous Anônimo, at 10:26 AM  


  • Menina,
    Eu não li nada sobre as escolas de base alemãs por aqui. Quanto ao Berlusconi, a cobertura foi bastante exaustiva. Ele já vai tarde. Você acha meus comentários radicais mesmo? Às vezes acho que sou meio condescendente.
    E não se considere pedante. Nós gostamos bastante dos seus comentários

    Madame Paulette,
    Essa peça parece ser das boas, mas acho que não consegue competir com Freud Anna. Nem as mães dos atores gostavam

    Madame Forrester,
    Essa peça era da Bia Lessa, não? Ela me parece uma versão feminina do Gerald Thomas

    Anônimo,
    Eu não poderia concordar mais com você. Não foi por outro motivo que fui a tantos espetáculos picaretas

    Abraços a todos

    By Blogger Marcos Matamoros, at 3:53 PM  


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