domingo, fevereiro 26, 2006

Memórias de um não folião

Eu abomino carnaval. A minha idéia de inferno? Ter que assistir eternamente a desfiles de escolas de samba na avenida. Se alguém quiser me torturar e arrancar meus segredos mais íntimos, é fácil. Basta me amarrar e me fazer ouvir por alguns minutos um CD de samba enredo. Depois de umas três daquelas músicas repetitivas e insuportáveis, eu confesso minha participação no esquema do mensalão, reconheço minha culpa na conspiração para matar Kennedy e admito que ajudei nos atentados de 11 de setembro.
Minha aversão pelo carnaval começa pelos carros alegóricos. Onde os comentaristas da Globo vêem beleza e criatividade, eu enxergo apenas mau gosto e breguice. Nada mais kitsch do que a águia da Portela.
Os temas escolhidos pelos carnavalescos são sempre originais e imprevisíveis. Quantas vezes você já viu alguma escola de samba mostrando o sofrimento dos negros no Brasil? As belezas naturais do país também estão sempre lá, assim como homenagens constrangedoras a personagens históricos. Neste ano, duas escolas falam de Santos Dumont. Mas há também as que preferem ousar. Uma escola de São Paulo, por exemplo, decidiu tratar dos 250 anos de nascimento do Mozart. Pobre Wolfgang. Nem Salieri pensaria numa vingança tão horrível.
Mesmo com temas tão diferentes, os desfiles me parecem sempre iguais. Se alguém me mostrar um teipe da Beija Flor de 1977 e um da Portela de 2003, eu não vou notar nenhuma diferença. Eu sempre fui democrático no meu gosto carnavalesco. Torço para que todas as escolas percam, o que, infelizmente, é impossível.
Há uma coisa que me intriga. Os desfiles ocorrem apenas uma vez por ano e as escolas se preparam por vários meses, mas ninguém consegue impedir que muitos carros alegóricos quebrem na avenida. Parece a ala das baianas. Não vale ponto, mas tem que fazer parte do desfile.
Eu também fico emocionado com os motivos pelos quais as escolas escolhem os enredos. No ano passado, a Mangueira falou de energia, um tema com apelo popular, que por acaso contou com patrocínio da Petrobras. Neste ano, uma escola do Rio, que vai tratar da integração latino-americana, recebeu uma graninha da PDVSA, a Petrobras da Venezuela. Eu também acho muito interessante o esquema de financiamento das escolas, que ganham dinheiro público repassado pelas prefeituras – e acho que também pelos governos estaduais – à liga das escolas de samba. Não é bonito o Estado colocar dinheiro em instituições que estão nas mãos de bicheiros e traficantes?
Mas eu não vejo tudo no carnaval com mau humor. As entrevistas com Jamelão, com seus 355 anos, são sempre impagáveis. Algum repórter irá perguntar a ele inevitavelmente como é ser puxador de samba na sua idade, e Jamelão dará uma patada no coitado, dizendo que não é puxador, mas intérprete. Os comentários de Lecy Brandão também são imperdíveis, sempre lembrando a importância da comunidade em cada desfile. E eu também acho maravilhosas as brigas na apuração dos resultados, em que os integrantes das escolas perdedoras choram e tentam agredir os jurados.
Eu sinto falta de apenas uma coisa relacionada aos folguedos momescos: a transmissão dos bailes de carnaval pela Bandeirantes. Na minha adolescência, era uma das poucas oportunidades em que eu podia ver mulher pelada em movimento. A outra era na Sala Especial, da Record. Eu sempre abominei carnaval, mas, quando era adolescente, com hormônios em ebulição, tentava não perder um baile. Os meus amigos, pelo menos, garantiam que eu veria um nível de sacanagem que faria Sodoma e Gomorra parecer recreio do jardim da infância. Vi muita baranga mostrando os peitos e milhares de closes de bundas cheias de celulite, mas nada que se aproximasse dos bacanais vistos – ou inventados – pelos meus colegas.
E eu aproveito o clima nostálgico para fazer uma confissão. No começo da minha adolescência, meu sonho era ir algum dia à Ilha Porchat e participar da Noite nos mares do sul. Para mim, era o máximo de devassidão a que o homem poderia aspirar. Como nunca fui à Ilha Porchat e não conheço ninguém que tenha ido, eu vou morrer sem saber se meus sonhos de luxúria correspondiam à realidade. Paciência!



sábado, fevereiro 25, 2006

Bum bum paticumbum ziriguidum II

Você tem que ver o roubo pelo lado positivo. Em vez de lamentar, pense que esse tipo de crime aproxima o Rio do primeiro mundo. Eu, por exemplo, lembrei imediatamente do roubo dos quadros do Munch num museu de Oslo, ocorrido há vários meses. A Noruega e o Brasil têm pelo menos alguma coisa em comum



quinta-feira, fevereiro 23, 2006

E por falar em suicídio II

Muita gente não gosta de estatística, mas eu adoro. Existe coisa mais eficiente para desmentir o senso comum? Veja o caso cubano, que tem índices de suicídio superiores aos suecos. A nossa esquerda adora vender a idéia de que Cuba é um país alegre, apesar de todas as dificuldades impostas pelo infame bloqueio americano. Os números mostram que não é bem assim. O cubano é o verdadeiro sueco da anedota, sempre pronto a se suicidar. As estatísticas deixam claro: não há cidade mais escandinava na América Latina do que Havana. O jeito alegre e comunicativo do cubano nada mais é do que uma máscara, que esconde na verdade um povo mais angustiado que protagonista de filme do Bergman



quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Patriotismo II

O brasileiro adora manifestar seu patriotismo desdenhando conquistas de outros países. Quando eu estava na faculdade, vi inúmeras vezes alunos e professores mostrarem desprezo pelo padrão de vida de países escandinavos porque o número de suicídios era altíssimo. Eu lembro de uma professora dizer, com ar triunfalista: são países ricos, mas que não resolveram todos os problemas do ser humano. Eu observava às vezes que não está ao alcance de um modelo socioeconômico resolver angústias existenciais, mas é óbvio que eu era visto como um alienado, que defendia países malsucedidos como a Suécia.
Pensando bem, o que é uma renda per capita de US$ 35 mil perto do nosso carnaval? Talvez eu seja muito pessimista e pouco patriota. Por isso, quando achar que o Brasil não tem jeito, eu vou me lembrar da criatividade e alegria que tomam conta do país nos desfiles de escolas de samba, patrocinadas por bicheiros e traficantes, um sinal de que até mesmo criminoso tem responsabilidade social. E, para me sentir superior aos suecos, eu vou imaginar como devem ser caretas os desfiles da Unidos de Estocolmo ou da Acadêmicos de Gotemburgo, com centenas de loiras sem nenhuma ginga se suicidando antes mesmo de atingir a dispersão



sábado, fevereiro 18, 2006

Esses artistas plásticos brasileiros e suas obras de arte maravilhosas


Ninguém com o mínimo de bom senso pode negar que o Brasil tem intelectuais de peso, como Marilena Chauí, Emir Sader e Olavo de Carvalho. Se eles escrevessem numa língua menos desconhecida que a inculta e bela, com certeza teriam reputação internacional. Mas, se nós já tratamos dessas figuras de proa da cultura nacional por aqui, reconheço que temos deixado em segundo plano outros gênios da raça: os artistas plásticos, que tão bem refletem a criatividade do povo brasileiro. Um dos melhores é, sem dúvida, Nuno Ramos.
A Folha de hoje traz uma entrevista com o gênio, que vai ocupar três salas do Instituto Tomie Ohtake com suas obras. Eu não vi, mas já gostei. Uma delas é uma instalação (sim, ele faz instalações), que, segundo a reportagem, consiste num "ambiente no qual três jumentos carregam caixas de som entre recipientes com água e montes de feno e de sal. Ouve-se a música 'Se Todos Fossem Iguais a Você', de Tom e Vinicius."
Perspicaz como poucos, o autor da entrevista não perdeu tempo e logo de cara lançou a pergunta que não podia ficar sem resposta: Como surgiu a idéia de fazer um ambiente usando burros? Nuno não se faz de rogado, e conta tudo: "Esse trabalho, chamado 'Vai, Vai', partiu das caixas de som cobertas por três materiais: sal, água e feno, idéia que vem talvez de um filme que fiz em homenagem a Nelson Cavaquinho, em que caixas de som eram enterradas e postas para tocar sob a terra. A novidade dos burricos é criar um sistema de vivência, com sua duração e literalidade, mas que estivesse pondo materiais e palavras em comunicação. Cada material tem uma voz, e os animais, carregando caixas de som e vivendo dos materiais cujas vozes eles carregam, promovem uma mistura, meio pachorrenta e estranha, entre matéria e sentido."
Observem a genialidade do artista plástico. Para mostrar que não é um homem de certezas absolutas, diz que a idéia talvez tenha nascido de um filme feito por ele. Perceberam? Nem mesmo Nuno sabe de onde veio a inspiração para uma instalação tão brilhante como Vai, vai. Eu só não gostei muito de seu excesso de didatismo. Afinal, eu tenho certeza que qualquer um chegaria sem ajuda à conclusão de que os burros estão lá para promover "uma mistura, meio pachorrenta e estranha, entre matéria e sentido".
Quando li essa resposta, achei que fosse o ponto alto da entrevista. Eu estava enganado. Há outros trechos que merecem no mínimo o mesmo destaque. O interessante é que o entrevistador mostrou estar à altura do entrevistado, como ao perguntar se Nuno "está ficando mais enxuto e econômico formalmente". O artista dá uma resposta não menos genial: "Não sei se enxuto ou econômico, que não são características muito minhas, mas espero que caminhe para algo formalmente mais poderoso. Isso é uma noção que nosso tempo parece ter perdido: a do poder da forma. O vocabulário formal é uma catapulta poderosa que lança a obra para além do controle social. Acho que a gente vive uma época extremamente controladora, e o pior é que aquilo que nos controla tem ótimos valores (ecologia, minorias étnicas etc.). Assim, há muita arte hoje de cabeça baixa, tratando com imediatismo as questões de nosso tempo. O repertório formal, longe de ser alienante, dá fôlego e imensidão ao querer da arte. Não conheço nada mais ambicioso do que as verticais, horizontais e cores puras de Mondrian."
Depois dessa aula de inteligência e brilhantismo, tomei uma decisão: vou ligar para a Sociedade Protetora dos Animais e denunciar o tratamento a que os burros estão sendo submetidos. Carregar peso o dia inteiro tudo bem, mas fazer parte de instalação de artista plástico brasileiro é demais
(Procurei uma foto de um dos burros para ilustrar o post, mas só achei essa daí do Nuno Ramos. Estava em dúvida se publicava ou não, mas percebi que não haveria muita diferença. Espero apenas que os burros não fiquem ofendidos com a comparação)



quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Curling, esporte de multidões

Nos últimos dias, eu vi alguns trechos das competições da Olimpíada de Inverno. Como sempre considerei futebol o único esporte de verdade, consigo, no máximo, achar engraçadinhas algumas das modalidades, e por pouco tempo. Depois de ver uns três minutos de uma corrida de patinação de velocidade, mudo de canal. Mas eu confesso que assisti a algumas coisas esquisitas. As roupinhas dos sujeitos que fazem patinação artística, por exemplo, são meio estranhas. Parece que são um grande sucesso em Brokeback Mountain.
Mas tudo se iluminou depois que eu vi uma competição de curling. É um esporte para poucos, que, mal comparando, lembra a bocha. A Confederação Brasileira de Desportos no Gelo (CBDG) explica que a "versão moderna do jogo originou-se de uma atividade ao ar livre praticada desde o século 16 na Escócia, jogada sobre lagos congelados, e se converteu no esporte altamente técnico atual, jogado em área coberta".
Para quem não viu, o jogo é mais ou menos o seguinte: um sujeito, quase de quatro, lança uma pedra, que tem um cabo parecido com o de um ferro de passar roupa, sobre uma superfície de gelo. Até aí, nada muito esquisito. O melhor vem depois: munidos de vassourinhas, dois sujeitos varrem o gelo freneticamente, para diminuir o atrito e, com isso, tentar conduzir a pedra para perto do alvo. Não há, em toda a história do esporte, uma função mais ridícula do que a do varredor, eu posso lhes garantir.
Segundo a CBDG, "o objetivo do jogo é, após o lançamento de todas as 16 pedras (8 para cada equipe), colocar uma o mais próximo possível do centro da casa, ou alvo, chamado de 'tee'". O site da entidade também informa os participantes chamam o curling de xadrez no gelo, por ser um jogo em que a “estratégia é definitivamente a coisa mais importante”.
Eu achava que o lacrosse era o jogo mais ridículo do mundo, mas nada, nada se compara ao curling. Como é que um esporte em que dois sujeitos ficam varrendo o gelo pode valer medalha olímpica? Se o curling é esporte olímpico, acho que queimada também deveria ser



segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Pain avec merde*

Ouvir funk é o hype do momento nos lugares descolados de São Paulo. Modernos e modernas que moram nos Jardins e provavelmente nunca foram à periferia paulistana dançam ao som da música feita por faveladas cariocas semianalfabetas. Quem sabe isso não é a prova de que a mobilidade social existe no país?
O que mais me emociona no funk é a qualidade das letras. Deize Tigrona é a Elizabeth Bishop brasileira. Eu sempre achei que letra de música não pode ser considerada poesia, mas mudei de idéia depois de ouvir trechos do funk Injeção:

“Injeção dói quando fura
Arranha quando entra
Doutor, assim não dá,
Minha poupança não agüenta

Tá ardendo,
Mas tô agüentando
Arranhando,
Mas tô agüentando”

Em entrevista à Folha, Deize mostra o rico e insuspeito diálogo entre o axé e o funk, que rendeu bons frutos. “Claro que o jeito que as meninas do funk dançam tem a ver com o rebolado da Carla Perez”, explicou ela, que vai fazer temporada em março no Rose Bom Bom, casa noturna paulistana. Tati Quebra Barraco também está sempre em São Paulo. Nos dez primeiros dias de fevereiro, fez oito shows, dos quais seis em São Paulo. Daqui a pouco, vai perder o sotaque carioca.
Um amigo meu dizia que o povo gosta de pão com merda, e de preferência com pouco pão. A frase sempre me pareceu irrefutável. Mas episódios como o sucesso do funk carioca entre os descolados de São Paulo evidenciam que é um erro restringir ao povo o gosto pela iguaria. O pain avec merde tem fãs em todas classes

* Este post se chamava originalmente Pain au merde, o que está errado. Como entendo de francês tanto quanto o Lula de português, eu prometo que não vou mais me meter a fazer gracinhas na língua do Proust, aquele escritor caubói que era piloto de Fórmula 1 e gostava de brigar com o Senna



A insuperável clareza de nossos intelectuais II

Enfiar o Brasil no Haiti foi uma decisão brilhante de política externa. O Haiti é um daqueles casos insolúveis, como se fosse um país africano como Ruanda ou Serra Leoa incrustado na América. A comunidade internacional age como se houvesse a possibilidade de uma solução para os problemas do país, mas, no fundo, todo mundo sabe que não há.
Não, não sou especialista em Haiti, mas não me parece ousadia afirmar que é inviável um país aterrorizado por gangues, em que mais da metade da população sobrevive com menos de US$ 1 por dia, tem 53% de analfabetos e a expectativa de vida é de 52 anos. Para ficar uma merda, o Haiti tem que melhorar muito. A probabilidade de o país dar certo é tão grande quanto a de Lula saber localizar o Haiti no mapa. Em resumo, o Guia Genial nos colocou numa fria. Quanto mais cedo o Brasil saír de lá, melhor.
O mais patético é que o governo topou chefiar a missão por avaliar que isso ajudaria a conseguir uma vaga no Conselho de Segurança da ONU, entre outros motivos. Como se viu depois, ficou claro que o Brasil não vai ter a vaga - o que até é positivo. Eu nunca entendi as vantagens que o país teria se entrasse no conselho.
Quanto ao texto do Gabeira, a citação do Cazuza é realmente o ponto alto. “O tempo não pára” é uma frase que me lembra a vizinha gorda e patusca do Nelson Rodrigues, sempre dizendo: “Nada como um dia depois do outro”



quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Diálogo brasileiro V

Eu tive uma rápida experiência como barnabé no começo dos anos 90. Por quatro longos meses, fui auxiliar judiciário, trabalhando no edifício da Justiça Federal de São Paulo na avenida Paulista. Fica ao lado do Masp. Sim, é aquele prédio de concreto com janelas quadradas, que parece um presídio.
Como todos os meus colegas, eu trabalhava pouco - eu também ganhava pouco, mas tinha acabado de entrar, e o cargo exigia apenas o segundo grau. Fiquei lotado no departamento pessoal, até hoje não sei por qual motivo. Logo percebi que a seção funcionaria muito melhor com muito menos gente. A maior parte dos funcionários mostrava um mínimo de dedicação, é verdade, mas ninguém nunca ficava um minuto além do fim do expediente. As pessoas não tinham nenhum ambição. Para que serviria? Promoções vinham com o tempo, e não por mérito. E, cá entre nós, é difícil ter ambição num lugar em que o trabalho é tão estimulante quanto ver um filme iraniano legendado em búlgaro depois de comer uma feijoada.
O trabalho não tinha nenhuma racionalidade. O que em qualquer empresa seria feito em três horas lá demorava três dias. Os funcionários não recebiam nenhum tipo de treinamento. Não havia nenhum método de gestão. Os chefes eram chefes porque tinham entrado antes dos subordinados, e não porque tinham preparo ou vocação para o cargo.
Em um mês, percebi que seria impossível continuar lá por muito tempo, ou eu morreria de tédio. Quando apareceu uma oportunidade na iniciativa privada, pedi demissão. Profissionalmente, foi a decisão mais certa que eu tomei na minha vida



quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Diálogo brasileiro II

Ou o Brasil diminui o tamanho do Estado, ou o Estado acaba com o Brasil. Os gastos do governo crescem assustadoramente, e pouca gente se dá conta disso. Nada menos neoliberal do que a política econômica brasileira nos últimos anos, como sempre diz o Eduardo Giannetti da Fonseca. Nos oito anos da administração Fernando Henrique, os gastos não financeiros do governo federal cresceram a uma média anual de 6% acima da inflação. No governo do Guia Genial, eles caíram em 2003, mas voltaram a aumentar nos dois anos seguintes. Em 2005, subiram 10,1% em termos reais.
A carga tributária, como se sabe, também aumentou grotescamente de 1994 para cá, de algo como 27% do PIB para os atuais 37% a 38% do PIB. Não é tão difícil entender por que o país cresce a um ritmo de cágado manco. O Estado gasta muito, arrecada muito e não investe quase nada. Quando o país se convencer de que o excesso de Estado é o grande problema do Brasil, as coisas vão melhorar uns 5.000%



terça-feira, fevereiro 07, 2006

Fanatismo nunca mais ou em busca da fatwa V

Em todo essa confusão, eu não vi nenhuma manifestação de intolerância por parte dos muçulmanos brasileiros. Entre os grandes jornais do país, pelo menos a Folha publicou algumas das charges de Maomé e, se não estou enganado, ninguém ameaçou os editores de morte. A sede do Torre de Marfim também não recebeu nenhuma carta ameaçadora depois de nós termos publicado as caricaturas. Isso é bom, mas não deixa de ser um pouco estranho. Imaginei duas hipóteses para explicar a atitude cordata da comunidade islâmica que vive no país:
1. O Brasil é uma sociedade tolerante, o que estimula até mesmo pessoas supostamente radicais a ter um comportamento tolerante
2. O Brasil é o país da avacalhação, e até o islamismo é avacalhado por aqui
Depois de pensar dois segundos sobre o tema, descartei a primeira hipótese. É claro que a segunda é a verdadeira. Quem diria que a nossa vocação para avacalhar tudo e todos teria um efeito positivo?



domingo, fevereiro 05, 2006

Fanatismo nunca mais ou em busca da fatwa III

Esse episódio mostra a intolerância e a incapacidade de aceitar outros pontos de vista que caracterizam boa parte dos muçulmanos. Nem o mais tarado anti-bushista poderá dizer que a reação insana dos islâmicos às caricaturas de Maomé é uma resposta à política americana para o Oriente Médio.
As ameaças de morte aos autores das charges e os incêndios nas embaixadas da Dinamarca e da Noruega na Síria são um exemplo claro de uma visão de mundo medieval. Isso já havia ficado claro com o caso Salman Rushdie. O autor dos Versos Satânicos não foi morto, mas um dos tradutores de seu livro foi assassinado. Aliás, o partido libanês Hezbollah declarou que, se Rushdie tivesse sido eliminado há 17 anos, o caso das charges não estaria ocorrendo. Bonito, não? E é bom lembrar que a fatwa foi decretada pelo aiatolá Khomeini, o então líder espiritual e político do Irã. Não me consta que algum líder político ou religioso ocidental tenha pedido a eliminação de Godard por ter dirigido Je vous salue Marie, ou de Saramago por ter escrito O evangelho segundo Jesus Cristo.
Em países em que há separação entre igreja e Estado, a reação a algo que uma religião considera blasfêmia não toma as proporções ridículas que a crise das charges começa a assumir. A política de Bush, em especial a invasão do Iraque, me parece equivocada, mas também é um equívoco não ver os perigos que a intolerância muçulmana impõe a países que prezam valores como o respeito aos direitos humanos e a liberdade de expressão. O caso das charges de Maomé, a fatwa decretada contra Salman Rushdie e o assassinato do cineasta holandês Theo Van Gogh são sinais que não devem ser ignorados.
Nos EUA, na América Latina e na Europa, há protestos contra a política americana para o Iraque, provas claras de que, na maior parte desses lugares, o direito à divergência existe e é respeitado. Curiosamente, nunca vi manifestações em países muçulmanos condenando os métodos terroristas da Al Qaeda ou a tática suicida dos homens-bomba palestinos. É possível que os governos islâmicos impeçam esse tipo de manifestação. Mas desconfio que, mesmo se elas não fossem reprimidas, não haveria quórum suficiente para encher um fusca com muçulmanos dispostos a protestar contra o radicalismo assassino de pessoas que consideram natural matar inocentes em arranha-céus em Manhattan ou num ônibus em Tel-aviv.
Não, eu não sei qual deve ser a resposta do Ocidente ao radicalismo muçulmano. Mas acho fundamental que as pessoas comecem a perceber que a intolerância islâmica não é nada inofensiva. Considerar esse radicalismo e a intolerância como valores culturais que devem ser “respeitados e compreendidos” pode custar caro a quem saiu da Idade Média há vários séculos



sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Fanatismo nunca mais ou em busca da fatwa



A intolerância muçulmana ataca novamente. Depois das declarações lunáticas do presidente do Irã, Mahmoud cara de porteiro Ahmadinejad que tem negado o Holocausto, a nova polêmica envolve a publicação de caricaturas de Maomé por alguns jornais europeus. O primeiro foi o dinamarquês Jyllands Posten, que publicou essas charges. Depois, outros jornais seguiram o exemplo, como o alemão Die Welt e o francês France Soir. Os muçulmanos ficaram bravinhos porque a tradição islâmica proíbe imagens alusivas à figura de Maomé, para evitar a idolatria. Uma das caricaturas também os ofendeu porque mostra o turbante do profeta como uma bomba. O problema é que um fanático islâmico bravinho não é o ser mais razoável do mundo. Em vez de criticar as charges por meio de cartas, por exemplo, houve quem preferisse ameaçar de morte os ilustradores. Boa parte do mundo islâmico está em fúria por causa das caricaturas. Além disso, há um boicote de produtos dinamarqueses em vários países árabes – acho uma bobagem, mas pelo menos é uma forma de protesto mais civilizada.
O France Soir publicou a charge que ilustra o post, com o seguinte título: "Sim, nós temos o direito de caricaturar Deus". O editor do France Soir, Serge Faubert, escreveu um texto contra a intolerância, em que afirma: "Chega das lições desses fanáticos! Não há nada nessas charges com conteúdo racista ou que denigram alguma comunidade". Mas o jornal deu para trás. Acabei de descobrir que o coitado do Faubert foi demitido. De todo modo, assino embaixo as suas palavras. E, em nome da liberdade de expressão, achei que o Torre de Marfim deveria publicar as caricaturas, solidarizando-se com os nossos bravos companheiros europeus. Se algum líder religioso muçulmano decretar uma fatwa pedindo minha morte, espero ter pelo menos o apoio de nossos 3,5 leitores

Atualização: Quem foi demitido do France Soir não foi o Serge Faubert, como eu havia imaginado, mas o diretor de redação, Jacques Lefranc, que também merece a solidariedade do Torre de Marfim



quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Lula e La Rochefoucauld III

O Brasil é um país curioso. Até há pouco tempo, a maior parte das pessoas no que têm curso superior considerava o cúmulo do preconceito comentar o despreparo do Lula. Em 2002, eu quase fui linchado algumas vezes por dizer que ele era semianalfabeto (viu como posso ser condescendente?) e que não tinha condição de comandar o país. A esmagadora maioria dos jornalistas, por exemplo, sempre foi fã de carteirinha do Lula – não estou falando dos donos dos jornais ou revistas, mas dos repórteres. Não é o que acha o Bernardo Kucinski, que escreve para o Guia Genial uma resenha diária do que a imprensa publica sobre o governo. Numa entrevista à Agência Repórter Social, ele diz “os jornalistas não têm respeito com a pessoa do Lula. Há sempre há um pressuposto de que ele vai falar besteira, vai errar, de que ele não conhece as coisas, usando como parâmetro um conceito de saber que é acadêmico. O Lula sempre foi tratado com discriminação e desrespeito”. É interessante que o sujeito encarregado de comentar o que a imprensa diz sobre o Lula não tenha a menor idéia do que se passa nas redações. Alguém deveria contar a ele que, nas eleições de 2002, o Guia Genial foi ovacionado por repórteres ao visitar uma agência de notícias



Autores

* Marcos Matamoros
* F. Arranhaponte


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